Carlinhos Colé
Mais triste do que não saber ler, é saber e não querer
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Textos
A fuga do Zé Vassourinha
                      No filme A Educação de Pequena Árvore, de Richard Friendenberg, o personagem do então ator mirim Joseph Ashton comprou de um membro da igreja do lugar, pelos cinqüenta centavos que ganhara do avô, um bezerro que veio a morrer no caminho para casa, à noite, na mesa do jantar a avó lhe deu outra moeda pela pele do animal e perguntou-lhe o que havia aprendido com a experiência, ao que ele respondeu do alto da inocência de seus oito anos de idade: _ Aprendi a nunca fazer negócios com nenhum cristão.
                      O garoto julgou a todos os cristãos pelos defeitos que conhecia de apenas um. Um mau julgamento. Em uma criança releva-se, mas, a maioria dos adultos carrega esse péssimo defeito. Exemplo disso é o amplo repertório de piadas de políticos, aliás, piadas de mau gosto:
                      _ “Vai a Brasília compadre? Cuidado com a carteira”.
                      _ “Político é igual mandioca: o bom está debaixo da terra”.
                      Outro dia ouvi a de um garoto a quem a professora perguntou:
                       _ Zezinho, qual é a profissão de seu pai?
                       _ Traficante, professora.
                       Preocupada, a boa senhora foi conversar em particular com o garoto:
                      _ É verdade o que você disse sobre seu pai, Zezinho?
                      _ É não, professora. É que fiquei com vergonha de dizer na frente de meus colegas que meu pai é deputado.
                      É claro que existem políticos bem intencionados, que trabalham pelo bem estar da comunidade, com abnegação e respeito pelo próximo. Se assim não fosse por que um homem como o Zé Vassourinha estaria andando atrás de conhecimentos acerca da empreitada a que ora se propõe?  O problema é que às vezes a imagem de uma pessoa pode se sujar por culpa de outras.
                      Nosso ilustre candidato a vereador foi procurado por um empresário importante na cidade, disse que acreditava muito nele como homem público e que estava disposto a investir algum dinheiro em sua candidatura. Esperava, é claro, poder contar com ele futuramente. _ Isso se chama Lei da Reciprocidade, meu amigo. Disse o bom homem. Entusiasmado com a promessa de ajuda e confiando que o suposto patrocinador iria honrar a sua palavra mandou imediatamente confeccionar, cartazes, faixas, santinhos e outros instrumentos de divulgação que a Lei permite, mas na hora de efetuar o pagamento o empresário virou um alfinete. Em conseqüência Zé Vassourinha anda mais apertado do que São Jorge na minguante, escorregando que nem bagre ensaboado. Anda agoniado, sem fome e sem sono. Não está acostumado a se passar por caloteiro e não tem coragem de encarar aqueles a quem deve.
                      Pepê, o colega de partido, explicou-lhe que precisa aprender a lidar com esse tipo de coisa. Um político tem de saber cozinhar as pessoas em banho-maria. Nunca dizer não a ninguém.
                      _ Ninguém gosta de ouvir a palavra não. Se a disser perde eleitor. Diga sempre sim e protele. Qualquer hora a gente vê isso. Amanhã. Mês que vem. Estamos esperando uma verba. De hora em hora, Deus manda a melhora. Sorria sempre. Diga palavras amáveis. Ria das piadas chatas. Elogie. Massagem no ego acalma até leão...
                      O amigo procedia assim. Sempre sorridente e loquaz. Bem vestido, perfumado. Tinha um sorriso cativante e um jeito seguro de se expressar. Zé Vassourinha não entendia por que ele próprio não se candidatara. Às vezes sentia-se usado e confessava isso ao amigo que logo enchia de novo sua bola convencendo-o de que ele, Zé Vassourinha, era o melhor entre todos os candidatos.
                      Resolvera, porém, tomar uma decisão sem consultar o amigo: vai desaparecer por uns dias até a poeira baixar.
Carlinhos Colé
Enviado por Carlinhos Colé em 18/01/2012
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