Carlinhos Colé
Mais triste do que não saber ler, é saber e não querer
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Textos
A dois
          Nos anos em que, ainda menino, trabalhei no Bar da Casa Velha, outras vezes lembrado em minhas escrevinhações, conheci um ébrio frequentador do lugar que, talvez eu houvesse apagado da memória não fosse haver o mesmo reaparecido em minha vida muitos anos mais tarde, em outras circunstâncias. Naqueles tempos ele vivia como qualquer ébrio, na dependência de um irmão que o provia do sustento necessário e,  sua roupa, apesar de surrada, estava sempre limpa, um sinal de que a cunhada, esposa do tal irmão, tinha para com ele um tico de caridade fraterna. Vivia a citar poetas conhecidos e a cantarolar conhecidas canções românticas, qual um adolescente apaixonado e, diziam ter ele um desses casos de amor impossíveis, boato que vim a comprovar como fato num outro tempo.
          Ocorreu-me o caso do ébrio enquanto buscava um tema para o texto desta semana, que dizem dos namorados por conter dois dias, um motivado pelo outro, representativos para os casais que se amam, o Dia dos Namorados e o Dia de Santo Antônio. Sabemos que o primeiro foi instituído para aquecer o comércio que, passado o Natal e o Dia das Mães, esfriava , tornando o mês de junho, um dos menos lucrativos do ano. Assim sendo e não podendo ser, porque o consumismo é que faz o mundo girar, dizem (e vendo o peixe do preço que comprei pela internet) que em 1949  uma loja de departamentos paulistas requisitou o publicitário João Dória, pai daquele Jr que você conhece,  a ajudar a aumentar as vendas, este então sugeriu criar o Dia dos Namorados, inspirado na data que já era comemorada nos Estados Unidos e na Europa em 14 de fevereiro. A data escolhida, 12 de junho, foi por ser véspera do Dia de Santo Antônio, o santo casamenteiro.
           O fato é, e aqui analiso eu, que o amor, como toda força positiva, sempre encontrou forças poderosas a obstar o seu avanço, porque os infelizes não suportam a felicidade alheia. No século III, o imperador romano Claudius II, cismou que o casamento, hoje tristemente chamado de relação estável, enfraquecia o soldado, porque estar em casa com a mulher amada é indubitavelmente mais agradável do que ir a campo matar ou morrer por um idiota que pensa ser Deus. Então o tal Claudius proibiu a Igreja de realizar casamentos. Um sacerdote chamado Valentim,  desrespeitou a ordem imperial e continuou às ocultas com as celebrações de matrimônio. Foi preso e condenado à morte. Enquanto estava na prisão, recebeu vários bilhetes e cartões, de jovens apaixonados, valorizando o amor, a paixão e o casamento. O bispo Valentim foi decapitado em 14 de fevereiro do ano 270. Por isso nas terras daquele povo que paga em euro ou dólar, comemora-se  a data em 14 de fevereiro. Valentine’s Day.
          Voltemos ao ébrio depois dessa longa digressão, voltei a encontra-lo cerca de trinta anos depois, quando fui trabalhar no asilo de idosos, pude comprovar a história do seu caso de amor impossível e vi que este adjetivo não se aplicava. Sua antiga namorada o visitava com frequência, os dois velhinhos sentavam-se no pátio, sob a mangueira que lá havia, e passavam a tarde namorando. Um namoro da forma em que concebi nos anos em que me formei como gente, talvez inconcebível para os moldes atuais. Aliás, como tantas outras coisas.
Carlinhos Colé
Enviado por Carlinhos Colé em 15/06/2018
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